quinta-feira, fevereiro 25, 2010

Campanha da Fraternidade

Ao lado direito da nave principal da catedral de Santa Cruz do Sul ergue-se um vitral, que mostra em primeiro plano os três mártires missioneiros, em memória das reduções jesuíticas, que tiveram seu fulgor maior nos conhecidos Sete Povos das Missões. As reduções estavam formatadas como cidades. Há via ruas, quadras, Igreja, praça, serviços, oficinas e tudo o mais para o bom funcionamento das atividades cotidianas. Cada indígena ao casar, recebia um lote de terra, conhecido como “abambaé” no qual ele trabalhava por quatro dias para o sustento de sua família. Os outros dois dias eram dedicados ao trabalho em uma área coletiva, conhecida como “tupambaé”. Ali todos produziam para o conjunto da redução, inclusive para a manutenção dos órfãos, viúvas e doentes.

Ao contrapor, de forma corajosa, a partilha solidária ao lucro exploratório, o Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil nos remete para a experiência missioneira, ocorrida aqui nos nossos pampas. Os guaranis que participaram daquela experiência o faziam de livre vontade e quiseram permanecer nas reduções, tanto que se rebelaram frente à união dos luso-espanhois, até então adversários, mas unidos no massacre às reduções missionárias. Sempre se poderá dizer que havia interesses estrangeiros por ocupação de áreas, manutenção de divisas, aculturamento ao qual os pajés não se sujeitaram, mas na essência estava ali uma proposta de gestão compartilhada, lembrando os princípios das atuais cooperativas e outras formas associativas.

A ganância, a busca desenfreada pelo poder e posição social, a ânsia consumista por constantemente novos produtos, a conquista de metas competitivas, tudo se soma na destruição das missões e se avoluma no exercício do capitalismo atual. É próprio do processo capitalista se nutrir do conflito que ele mesmo cria, gerando disparidades sociais e destruições ambientais. Ao problema segue uma solução, que por sua vez se transmuta em nova dificuldade e assim segue, numa sequência de aparente satisfação perante a aquisição de um novo produto, imediatamente descartado para que outro se lhe suceda.

Porém, há uma questão anterior ao próprio capitalismo, que não deixa de ser consequência de nossa forma de “ver” o mundo. Enquanto não conseguirmos perceber que as coisas não estão separadas, fracionadas, mas intimamente interligadas não temos como agir na integralidade. Enquanto entendermos a realidade como linhas que se diferenciam, como dimensões e variáveis, sempre daremos campo à predominância do econômico, que se impõe pelos nossos intentos consumistas e de competitividade, o que gera a disparidade entre nós e a natureza. Já Abel e Caim se debatiam em apresentar a melhor oferenda, quando as duas poderiam ser boas.

A mudança primeira tem a ver com a nossa consciência, que se bem ouvida, nos apontará para um novo Saber, que levará a atitudes integralizadoras, harmonicamente partilhadas, já pretendidas pelo sistema “tupambaé”.

Um comentário:

  1. Curiosidade: quando a Igreja converteu os índios ao catolicismo, não começou a destruir a cultura deles?

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